Conto – Nascimento de Norrath

Olá novamente. Depois de um bom tempo sem postagens consegui voltar para o site.

Hoje quero postar um conto que escrevi. Esse conto é sobre Norrath, uma cidade que estou criando para o grupo Tormenta RPG do facebook. Esta cidade seria a base da mesa que eu mestraria para eles, uma história sobre uma cidade que sofreu um grande acidente e acabou sendo atirada para fora do espaço-tempo. Como o projeto não vai mais pra frente (não usarei a cidade na mesa do grupo) eu vou postá-la aqui. Vai que alguém se interessa.

Mas primeiramente eu postarei apenas a história de como Norrath foi criada e como ela conseguiu os três deuses menores que a governam. Depois postarei mais informações com um arquivão mais completo. Por enquanto fiquem com o Nascimento de Norrath.


Há décadas Norrath era uma cidade pequena, uma pequena mancha na vastidão da savana. Fundada por uma expedição da igreja de Tanna-Toh após anos e

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Gafanhoto-tigre, inseto que caça como um predador  feroz. Não tá fácil na Grande Savana…

anos de viagens pelo selvagem e desconhecido continente norte. Quando sua líder faleceu (nas garras de um bando de estranhos animais nomeados gafanhotos-tigre) eles finalmente resolveram assentar e estudar o que haviam encontrado.

Não demorou para que as tribos bárbaras aparecessem. Algumas amigáveis, curiosas de fato, e outras hostis, e perigosas. Mas frente a tanta barbárie e falta de civilização os devotos viram ali sua verdadeira missão. Dar a eles o mesmo dom que Tannah-To havia dado a cada um, o dom do conhecimento. Construíram uma escola e chamaram os bárbaros, deram a eles uma simples mensagem (graças a magia divina, difícil imaginar comunicação co
m tantos dialetos sem ela): Queremos ensinar! E essa mensagem percorreu a savana. E os interessados em aprender vieram.

De tantos, a escola havia ficado pequena! Enquanto ela era expandida os novos alunos fixavam ali suas residências, formavam suas famílias. E em pouco tempo comerciantes apareceram vindos do deserto ao norte. Há pessoas lá! Uma tribo de nômades! Vários devotos ficaram loucos de curiosidade: Que conhecimentos eles têm? Como vivem? Como é o deserto? Que perigos há nele? E, frente a tantas perguntas sem resposta, alguns partiram com os comerciantes na viagem de volta, outros ficaram e prosperaram sua missão. Em pouco tempo a pequena escola havia virado uma pequena cidade: Norrath! (Nome da líder do grupo que morreu antes da fundação da escola, o nome da mulher que os uniu em torno de um ideal e que permitiu a eles exercerem sua verdadeira missão).

Mas, ainda haviam as tribos bárbaras hostis. Vários líderes tribais viam a formação de uma aldeia tão grande como uma ameaça! Então eles deixaram de lado suas guerras ancestrais (por enquanto) e se uniram para combater a ameaça que se formava. Um exército bárbaro se formou e marchou para Norrath.

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Ao saberem da notícia da guerra eminente muitos fugiram. Outros, homens e mulheres dispostos a lutar pelas suas novas vidas, ficaram para lutar. Mas dos que ali estavam poucos eram guerreiros, a maioria eram de professores, pesquisadores, cientistas, artesões, comerciantes, ferreiros e outras profissões. Eles não eram generais, eles não eram guerreiros, eles eram plebeus. Eles se viraram para a única esperança que havia: aventureiros. Os clérigos enviaram vários mensageiros: precisamos de heróis! Mas o exército bárbaro se aproximava e eles não tinham heróis, as fazendas mais distantes foram queimadas e eles não tinham heróis, a sombra do exército podia ser vista no horizonte vindo em direção à cidade e eles não tinham heróis.

O povo se preparou da melhor forma que pôde. Mas, frente ao exército inimigo, era clara a derrota. E quando o exército bárbaro chegou, a esperança se esvaiu completamente.

Muitos renegaram sua fé em Tannah-To naquele instante e ela perdeu a fé neles também. Abandonados por sua deusa protetora e à mercê da morte certa eles perderam as esperanças, o desespero tomou um a um os corações dos defensores e o caos implodiu a pouca resistência que poderia haver.

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Ao longe, à frente do exército inimigo, os líderes tribais viam isso e gargalhavam fortemente da fraqueza daquela tribo. Se julgavam tolos por pensar que ali
haveria alguma ameaça a eles. Nesse momento de pura descontração e alívio dos líderes ninguém percebeu um cheiro de terra remexida e pequenos tremores que anunciavam o que viria a seguir: Em 2 pontos, quase distantes, onde o exército bárbaro se encontrava o chão sacode violentamente derrubando vários soldados no chão. Segundos depois o chão rasga como se fosse feito de tecido fino e engole vários e vários guerreiros que ansiavam por um combate.

O caos toma conta do exército que já não tinha muita disciplina, vários correm por todos os lados como formigas que tentam proteger o formigueiro atacado. Alguns acusam a tribo rival pelo acontecido e pequenas lutas acontecem aqui e ali. Dessa vez o zumbido no ar foi ouvido por todos… e o primeiro raio atingiu o solo…. Aonde a terra não havia engolido os homens, a tempestade elétrica atacou. Raios caiam violentamente castigando o já bagunçado exército bárbaro e anulando de vez qualquer chance de recuperação.

Olhando para aquilo tudo sem entender o que acontecia estavam os cidadãos de Norrath. Estupefatos pelos fenômenos naturais, que só castigavam o exército que vinha matá-los, eles não se moviam. O silêncio só foi quebrado por um único grito, alto e claro que assustou a todos presentes: Avante!

Do caos infernal que havia se tornado o exército à frente, um cavaleiro desponta em plena cavalgada em direção à cidade. Vestido em armadura pesada e cavalgando um cavalo branco também vestido com a pesada proteção, um garanhão que só lhe emprestava mais majestade, ele se aproximava da cidade gritando: Avante Norrath, defendam a si mesmos. Somos a ajuda não o exército. Avante!Cavaleiro

Aos poucos os cidadãos recuperavam a sanidade perdida e se firmavam no cavaleiro
que gritava ordens e incitava ao combate. Cada cidadão sentiu o coração se inflamar e a vontade de pegar em armas surgiu queimando no peito, fazendo escorrer lágrimas de fúria e surgindo um brado de guerra na garganta de cada um. Os, agora guerreiros, saiam de suas posições defensivas e se lançavam numa carga liderada pelo cavaleiro. Os bárbaros nem viram o que os atingiu. Frente a falta de organização e liderança (alguns líderes já haviam morrido para os temíveis raios ou engolidos pelas fendas ainda pulsantes) a carga de Norrath avançou atropelando os sobreviventes do primeiro ataque.

O cavaleiro assobiou alto e então os raios cessaram e o chão se fechou num instante. Mas não estava terminado, os fatos sobrenaturais ainda estavam longe de terminar. Nos flancos do exército inimigo surgiam duas grandes muralhas, uma de pedra e outra de plantas, cada uma fechando a rota de fuga dos apavorados (já não mais confiantes em sua vitória) guerreiros e condenando-os à lutarem por suas vidas ou desistirem dela.

Não durou muito, o exército bárbaro foi obliterado em poucos minutos. Seus números reduzidos a nada; por outro lado Norrath sofreu poucas baixas. Eles triunfaram! Eles venceram! Graças ao cavaleiro! Enquanto o povo mal acreditava no que havia acontecido, um gosto salgado toma o paladar de todos e o ar parece ficar difuso, as proteções mágicas forma desfeitas, e surgiram então um homem e uma mulher que estavam ocultos por magia. O homem tinha um aspecto velho (muito velho) e cansado, mas seu corpo emanava uma energia diferente, seus olhos faiscavam um poder visto por poucos cidadãos de Norrath: energia arcana. A mulher era bela, pelos deuses como era bela. Orelhas pontudas, traços suaves e gentis, corpo magro, mas delineado à perfeição, uma obra de arte! Nem seu cabelo esverdeado (bem diferente, convenhamos) lhe tirava uma ponta sequer de beleza, ele a completava, dava a ela o elemento de equilíbrio.

O cavaleiro se dirigiu aos 2 estranhos recém aparecidos e desmontou, após uma pequena olhada por ferimentos e lesões (feitas pela bela mulher) eles comemoram. O guerreiro saudava seus amigos pelas magias, e eles o saudavam pelo plano. Ficaram assim por um tempo trocando amenidades. Demorou até que o primeiro Norraniense se aproximasse para falar algo. Recebido pelo guerreiro que apertou com força e entusiasmo a mão do pobre sujeito e gritou ao povo de Norrath.

– Somos os aventureiros que pediram, desculpem a demora mas encontramos muitos inconvenientes no caminho até aqui. Mas acho que chegamos em tempo, não é?

O povo explodiu em lágrimas, vivas e aplausos. Parte pela vida que haviam mantido, parte pela vinda dos heróis. A noite chegou fria como sempre. Cansados da luta (que havia acontecido horas antes mas parece que foi a anos atrás) os norranienses nem comemoraram, todos estavam exaustos e dormiram do jeito que lhes foi permitido.

A manhã veio, e com ela a responsabilidade de lidar com os mortos da última batalha (aliados e inimigos) e novamente os heróis tomaram a frente. Os antigos líderes, entre eles o único clérigo de Tanna-toh (agora um ex-clérigo) de que Norrath dispunha, também ajudavam. Porém não davam uma ordem ou se intrometiam no que os três diziam, a palavra deles era lei, e a lei tem de ser respeitada. Valanir (o ex-clérigo) via os três com fascinação tremenda. Seus atos heroicos arrebataram o coração do homem que havia jurado amar apenas a uma entidade. Ele agora amava três. Sua fé foi restaurada, mas não do mesmo jeito. Seu foco havia mudado e ele acredita que aqueles três que atenderam o mais desesperados dos pedidos eram deuses que haviam vindo atender ao chamado que sua antiga deusa havia ignorado.

Ao entardecer a cidade se reuniu na praça central para enfim comemorar. Um pequeno palco foi montado, e colocado sobre ele uma mesa onde os três se sentariam para aproveitar a festa numa espécie de local especial, de honra. Apesar do cansaço a população compareceu em peso, eles precisavam demonstrar o agradecimento e afeto que sentiam por aquelas três figuras que os salvaram da morte certa.

A comida era farta, a cerveja e vinho também. Bardos saiam aos tapas para poderem subir ao palco e homenagearem os heróis com suas odes e canções recém compostas. Lá pelas tantas, já com céu escuro e ânimos mais calmos Valanir sobe ao palco aonde os heróis estão sentados e pede a atenção de todos.

– Meus amigos, eu gostaria de dizer algumas palavras. Sei que a comida está ótima e que o vinho esta noite tem um sabor especial, sabor de vida renovada. – Aplausos se seguem, mas ele faz sinal com as mãos para que o escutem – Ontem encaramos a morte de frente, ontem tivemos um vislumbre do que é o verdadeiro desespero pela vida. Eu sei, eu também o senti. Ontem orei para Tanna-Toh clamando por ajuda, clamando por socorro e conforto.

Sabem o que ela respondeu? Nada! Enquanto eu via o inimigo vindo para estocar nossas cabeças em suas lanças; enquanto eu via vocês, um a um, darem vazão ao medo que estava em seus corações; enquanto eu sentia que o medo que residia em meu coração suprimia a minha própria fé – ele parou repentinamente de falar e engoliu em seco, visivelmente constrangido – eu quero confessar, naquele momento eu abandonei a fé em Tanna-Toh. Não sou mais seu representante e não sou mais abençoado com seus milagres.

Um burburinho se segue na multidão, mas novamente ele faz sinal para que continuem a ouvi-lo.

– Em momentos de provação, em momentos onde não parece haver saída e nos encontramos em tempos sombrios, muitas vezes nos voltamos à fé. Ela parece nos guiar e tornar mais fácil nosso caminho. Porém essa fé tem que ser depositada na esperança certa, na pessoa certa para que não seja em vão, para que não seja uma simples crença que morre com quem a teve. Hoje, meus amigos, irmãos e conterrâneos eu mudei minha fé. Hoje eu cheguei à conclusão de que nossa fé deve ser depositada em quem realmente pode vir em seu auxílio, em quem se arrisca por você e usa a própria vida como escudo de algum estranho. Se há alguma fé em mim hoje, e há, eu a deposito nos três que vieram em nosso auxílio, e rogo pelas suas bênçãos…

Valanir então vira para os três já pasmos com a atitude do clérigo e se ajoelha, num misto de mesura respeitosa e pose de oração, a população que lotava a praça central olhava atônita a declaração de um homem tão conhecido e amado. Os heróis se levantam num sobressalto e antes que o pensamento alcance a boca para pedir que o clérigo se levantasse, uma outra pessoa próxima também se ajoelha, em poucos segundos outra, e outra, e outra…

Como uma doença contagiosa, as ideias e discurso de Valanir alcançaram o coração de cada pessoa ali presente. Em um simples discurso ele traduziu o que muitos sentiam em seu coração e seu gesto de humildade encerrou qualquer dúvida e incerteza. A multidão antes de pé começava a parecer mais baixa, começava a se ajoelhar perante seus deuses. Quando a última pessoa na vista se ajoelhou, a luz bruxuleante das tochas era a única coisa que se movia. O vento era o único som. Os três olhavam atônitos o desenrolar daquela situação e o guerreiro foi o primeiro a sentir algo diferente.

De repente ele sentiu os sentimentos de cada um dos que estavam ali tocar-lhe. Ele sentiu a crença deles e isso parecia virar-lhe de ponta cabeça. Ele sentiu a confiança que cada homem, mulher e criança depositavam nele e isso mudava a essência do seu ser, mudava tudo que ele era e poderia se tornar. Ele teve tempo apenas de olhar para os lados e ver a espanto estampado no rosto dos amigos, provavelmente com a mesma sensação. Valanir olhava com lágrimas nos olhos os três heróis sendo banhados por uma luz cálida e reconfortante. Eles pareciam diferentes, majestosos e… e… Divinos!! A sensação de ser protegido retornou a ele de imediato, ele sentiu a centelha divina crescer nele novamente.

Valanir orando

Ali, ajoelhado e chorando como um bebê, ele orou para a tríade pela primeira vez…


E aí está, Norrath surgiu como cidade a partir desse momento. Depois disso a cidade mudou sob o governo da Tríade (como os três heróis passaram a ser conhecidos) e se tornou um império que governou grande parte da Grande Savana, mas isto fica para outro post. Obrigado por ler.

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